Primeiro de Agosto de 2000



A chuva lá fora está intensa. Faz quase um mês desde a última carta que te escrevi, ela ainda está guardada na minha gaveta mas isto não conta. Hoje, quando dava banho em Miguel me lembrei da vez em que me levou àquele parque em que você sempre falou. Lembrei das flores e da maneira em que aquela chuva caiu, depois de um dia - quase - inteiro de sol nos fazendo tomar um majestoso banho. E depois quando chegamos em casa e tomamos um banho quente você sentou junto à janela e me chamou para acompanhá-lo. Trouxe um café quente e me sentei ao seu lado me aconchegando em volto de seus braços enquanto você citava algo sobre a chuva ter a ver com a gente, ou apenas enquanto você dizia que gostava de estar ao meu lado, e o quanto eu ficava bonita de cabelo molhado. Sorri sem pensar muito, independente do quão lindo você havia sido naquele momento, não havia nada melhor do que estar ao seu lado com seus braços em volta de mim, me aquecendo e me protegendo. Sabe Miguel, às vezes penso se um dia vou encontrar alguém como você... sinto a sua falta!

Ah não, havia jurado que não choraria escrevendo-lhe. Peço que me perdoe, é só que... Enfim, quando mostro sua foto pra Miguel e conto histórias sobre você (só as verdadeiras, claro) ele fica atento a minha fala e sorri. Posso ter certeza, de que mesmo ele não te conhecendo - o que mais sinto - te ama. E mesmo sendo essa pessoa indefesa, pequena e mágica sei que ele é grato por tudo o que fez por nós. Bom... bom, já estou eu a chorar novamente, será que nunca vou parar com isso? Caso você estivesse aqui tenho certeza que sorriria seu melhor sorriso enquanto passaria a mão entre meus cabelos e diria que sou tão emotiva que às vezes pareço que vou chorar a noite toda. Então eu sorriria.

Acabei de fazer aquele cappuccino com canela que você adorava, aceita uma xícara? Está uma tarde fria. Minha mãe esteve aqui ontem... chegou como sempre com aquele olhar severo e reclamando de tudo, mas se deteve quando soube que não adiantaria o que ela dissesse eu não sairia de onde vivemos nossos melhores momentos. Ela até me confessou que sente falta de você sem se dar conta do que havia falado, quando começou a balançar a cabeça dizendo que seria melhor eu e Miguel ir morarmos com ela. "Uma pessoa a mais pra lhe ajudar, você faz tudo sozinha, não precisa ser assim..." ela disse. Mal sabe ela que é assim que me encontro. Sem contar no novo vizinho que outra hora me trouxe uma torta de maça que a esposa havia feito. Espero que não se importe, meu bem, mas o convidei para entrar, Miguel estava na sala com seu trenzinho. Tadeu o nome do tal vizinho. Estava a me contar que sua mulher faz as melhores tortas do mundo, e cheguei a ver um brilho em seus olhos, coisa que a muito não via. Mas este brilho logo se perdeu quando me contou que hoje ainda faz as tortas, mas trata de uma leucemia que a deixa fraca. Mudei de assunto.

Outro dia fui visitá-los. Me cortou o coração, Miguel, ela com um lenço cobrindo a cabeça, toda sorridente, como se nada a abalasse. Sorri de volta e conversamos por horas enquanto Tadeu passeava com Miguel mostrando-lhe cada bicho diferente que encontravam. 

Falando nele, pude ouví-lo no quarto. Bom, tenho que ir então... espero que esteja bem, meu amor. Até breve!

Da sua - eterna - Ane.

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